10
Set

ANÁGUA DE VÉNUS: OU O SAIOTE DA SENHORA DO ALMURTÃO

Icconna
Idunna
Maeve
Maia
Senhora do Almurtão
Cona é teia, rede de vida
Luminosa, Loiminna
Agora Mulher, outrora Menina
Acolhendo as águas da transformação
No transe do corpo
Da Murta madura
Do falo erecto, ressurecto
Vida verde de verde homem
Emergindo da Terra pura
Com toda a vegetação
Disseminado Semente sémen
Que é a continuação
Oferendas de seiva do corpo ao sagrado chão
Fogo que retorna e não esmorece
Idunna da Primavera
Maia Verde que nos aquece
Maio Maduro que nos ergue em tesão
Menos tensão e mais paixão
Doada às forças do fogo, da terra, da água
Para honrar a chama da criação
Que é o princípio da vida
Pétalas doces
Murta, Almurtão
Bebo teu perfume,
tua ancestral poção
Abro a visão, vulva coração
É Volva que voa do Norte ao Sul
Portal infinito
De transmutação
Para a Terra só há
A lealdade da presença em dádiva
Do Amor perante a perda
Que semeia a esperança
Maeve da véspera de Maio
Suaves pétalas de lábios intensos
Despindo o véu diante das fogueiras
Se nascemos nuas
É nuas que somos inteiras.
Rosto de corça, rosto de veado
Somos animais,
estamos entre iguais
No mundo infinito.
Só quem é igual respeita
Só em reverência se é bendito.
Ocre, âmbar, almíscar.
É hora, agora.
Epona
Egua
Ebora.
Que a cavalgada selvagem da vida
Complete a cavalgada selvagem da partida
Num ciclo que nunca termina
Que só no Amor corpo terra
Se pode tecer
Para que o Espírito se apresente
Cantando, guiando, orando.
Almurtão
Almurtão
É pagão quem entrega o coração ao sagrado chão.
A roda da Azenha virou,
A Senhora subiu o monte
Seus seios dourados
São pólen e sol.
Canta a cotovia,
Canta o rouxinol.
Há dias de chuva,
Há dias de Sol,
Para lavar e secar o meu lençol.
Em dias de luta
Noites de paixão
Para manter ardente
A fonte de devoção.
É uma labuta
É um chamamento
Há uivos gemidos
No silêncio do vento.
Vem Maio
Inteiro
Traz a trovoada
Vem Senhora Bárbara
Com cálice e espada.
Guardando o mistério
A exultação
Da noite bendita
Perante as estrelas
Sagrada Paixão
Vertendo sobre o chão.
Acende a chama
Do altar interior.
Não outro fogo
Que não o do Amor.
Beltane, Maio
É fidelidade
Sacerdócio supremo
Maio 2020
Fotografia de Luis Conde, performance Brixta