02
Jun

DOAR-SE

Falámos com os bombeiros de Pedrógão hoje.
Perguntei ao Senhor que me atendeu o que era necessário. Respondeu-me com a voz dorida: precisamos de tudo minha Senhora, rigorosamente tudo.
Só não temos como vir buscar e a maior parte das corporações de outros locais já cá não vem trazer.
Expliquei-lhe que nós iríamos, e que iriamos ligar regularmente. Expliquei-lhe que sou descendente da Pampilhosa da Serra, que conheço bem o Inverno e que receio como vai ser quando outras notícias entrarem écrans adentro nas nossas casas e vidas e nos esquecermos deste fogo, entre a rapidez das tarefas. E nas noites longas a Beira faça sentir o seu cortante e demorado frio.
Ele disse-me que esse também era o medo dele, que faltassem cobertores e agasalhos. Que agora é tudo de Verão mas o Inverno há-de chegar.
Agradeci-lhe muito, disse-lhe que lamentava muito as críticas que recebiam.
Ele comoveu-se e respondeu:
– A Senhora nem imagina, ninguém pode imaginar o que isto é. Deixei arder a minha casa para ir salvar a dos outros, podíamos ter morrido e ninguém agradece.
Senti as lágrimas rolarem dos meus olhos e vi a Lila Nuit, que me escutava ao lado, encher os olhos de lágrimas também.
E renovei o meu agradecimento:
– Podia ter sido connosco, ninguém está nunca a salvo. Agradeço por colocar em risco a sua vida por quem precisa. Agradeço muito.
Do outro lado, o Senhor Bombeiro chorou, mandou-me beijinhos e tudo. Agradeceu-me quase mais do que eu a ele.
Julgar é mesmo o oposto de ajudar.
Como seria se cada um de nós desse exactamente o que gostaria de receber, nesta situação como em todas nas nossas vidas? A mesma escuta, empatia e compreensão, e na mesma medida, do que buscamos receber?
Como seria encontrar o espaço interior da dádiva, da possibilidade e repôr em vez de retirar o que é mais necessário em nós, nos outros e nas circunstâncias?
A cada passo deste caminho sinto e sei que o mais essencial é a prática da compaixão radical, aquela que é absolutamente inclusiva.
A prática contante e quotidiana do alquímico coração ardente, imperecível, que guarda o espaço do fogo interior intacto que jamais se apagará e que pode ajudar quem se perdeu a reencontrar-se.
Todos somos tremendamente humanos, que possamos abraça-lo com a integridade de receber cada fragmento e repara-lo, o melhor que podemos.
Ser pacifista é hoje em dia o maior caminho de activismo.
Paz activa nas orações, pensamentos, emoções, acções.

Agradecemos muito a tod@s os que têm apoiado.
Aos 23 círculos de oração conjunta em todo o país, às mãos e corações cujo nome desconhecemos e que estão em campo, cuidando.